Passeio de escola em MT que terminou com aluno morto em cachoeira foi feito sem guia

Passeios em trilhas e cachoeiras eram feitos com guias de turismo até novembro deste ano — Foto: Rafaella Zanol/Secom-MT

Passeios em trilhas e cachoeiras eram feitos com guias de turismo até novembro deste ano — Foto: Rafaella Zanol/Secom-MT

O passeio no Circuito das Cachoeiras, no Parque Nacional de Chapada dos Guimarães (MT), em que um estudante de 14 anos morreu afogado nessa segunda-feira (6), foi feito sem guia de turismo, como confirmou a direção da Escola Estadual Professor Welcio Mesquita de Oliveira, em Cuiabá. Desde o dia 23 de novembro, os passeios podem ser feitos sem guia, de acordo com uma portaria do Ministério do Meio Ambiente.

Daniel Hiarle Arruda de Oliveira, de 14 anos, morreu em excursão de escola — Foto: Arquivo pessoal

Daniel Hiarle Arruda de Oliveira, de 14 anos, morreu em excursão de escola — Foto: Arquivo pessoal

Daniel Hiarle Arruda de Oliveira e outros dois alunos desapareceram durante o passeio. Os outros dois foram encontrados pelo Corpo de Bombeiros e passam bem. Daniel foi encontrado morto na cachoeira.

O corpo de Daniel foi encontrado a 3 metros de profundidade, depois de 5 horas de busca. A ausência dos três estudantes só foi notada na hora de ir embora, quando o grupo estava no ônibus.

A liberação dos passeios sem guia é considerada por especialistas da área como uma medida de alto risco.

A presidente do Sindicato dos Guias de Turismo de Mato Grosso (Singtur), Susy Miranda, afirma que, mesmo antes, quando existia a obrigatoriedade de guia no Parque Nacional para grupos de 11 visitantes, alguns incidentes poderiam acontecer, mas que, com a presença do profissional, eram sanadas ou evitadas.

“Agora imaginem abrir esses atrativos ao público, que muitas vezes não respeita as regras. Ia dar no que deu. Infelizmente aconteceu, mas poderia ter sido evitado”, disse.

A direção da escola informou que o grupo de cerca de 60 alunos estava sendo monitorado por seis profissionais da educação.

Para a presidente do SingturMT, o incidente poderia ter sido evitado se o grupo tivesse acompanhamento de um guia profissional.

“A partir do momento em que o conselho deliberativo do parque decidiu colocar as trilhas das cachoeiras abertas ao público, nós fomos contrários”, diz.

Ela ainda ressalta que o Singtur pretende acionar o Ministério Público. “Não dão importância à categoria de guia de turismo. Às vezes a pessoa quer economizar R$ 200 a R$ 300 no passeio e olha no que dá. É bom valorizar o trabalho do profissional. Quando tinha guia, não acontecia esse tipo de coisa”.

Vista aérea da cachoeira véu de noiva na Chapada dos Guimarães — Foto: Secom-MT

Vista aérea da cachoeira véu de noiva na Chapada dos Guimarães — Foto: Secom-MT

Passeio guiado

 

A exigência do acompanhamento de guia de turismo para o passeio nessa trilha, em Chapada dos Guimarães, começou em 2008 depois da morte de uma jovem de 17 anos, em um acidente na Cachoeira Véu de Noiva. Saira Tamires Dutra dos Reis e outros cinco banhistas ficaram feridos após parte da encosta da cachoeira desmoronar.

O circuito de cachoeiras do Parque Nacional de Chapada dos Guimarães ficou fechado pra visitação por um longo período. Depois foi reaberto pra visitação só com guia de turismo.

No dia 23 de novembro passou a valer uma portaria do Ministério do Meio Ambiente liberando ‘trilhas auto guiadas’, no Parque Nacional de Chapada dos Guimarães. Segundo o documento, 150 vagas diárias estariam abertas, desde que respeitando as regras do Parque, como o plano de manejo e o reconhecimento de risco.

O plano de manejo é um estudo técnico sobre a capacidade que cada atrativo turístico tem para receber uma quantidade certa de pessoas para não degradar o ambiente.

Segundo o guia de turismo e especialista em Normas Técnicas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), Brasilio Ataide Neto, o Sistema de Gestão da Segurança cumpre um papel fundamental de controlar, reduzir ou eliminar os possíveis perigos em todas as situações do turismo ao ar livre. “Infelizmente ainda não há uma cultura e consciência nesse sentido, tanto de alguns empresários, quanto do setor público”, diz.

Em relação ao acidente com o menino encontrado afogado durante a excursão da escola no Circuito da Cachoeira, Brasilio avalia que as condições para receber os turistas eram precárias. “Pode-se observar a fragilidade nas ações de disponibilizar o atrativo, aonde não se tem planos de contingência aptos a serem acionados, e as condições de segurança em todo seus aspectos são precários”, afirmou.

Ele ainda disse que a liberação por parte da administração do Parque Nacional em permitir ‘trilhas auto guiadas’ traziam riscos. “Essa condição por sua natureza já é perigosa para esse tipo de oferta. Para isso, a instituição deve ter todo um aparato de segurança clara e bem definida, e mesmo assim dependendo do tamanho do grupo, o melhor é evitar para não incorrer em situações de risco”, explicou.

De acordo com uma norma técnica da ABNT, a quantidade de pessoas por grupo deve ser seguida por uma escala de profissionais condutores e seus auxiliares. De 1 a 10 clientes por grupo, deve ser acompanhado por um guia e um auxiliar. Já para um grupo de 11 a 20 pessoas, a norma estabelece dois guias e um auxiliar. Todas essas são condições mínimas, segundo a norma.

Cachoeira da Prainha, em Chapada dos Guimarães — Foto: Rafaela Zanol/ Secom-MT

Cachoeira da Prainha, em Chapada dos Guimarães — Foto: Rafaela Zanol/ Secom-MT

Morte em cachoeira

 

As buscas por Daniel começaram por volta de 18h30, na Cachoeira da Prainha, onde ele tinha sido visto pela última vez, segundo o Corpo de Bombeiros.

Cinco bombeiros e um cão de busca participaram da operação, com duração de aproximadamente 5q horas. A equipe dos bombeiros mergulhou na cachoeira e localizou o corpo do adolescente, a 3 metros de profundidade.

Os bombeiros acionaram a Perícia Oficial e Identificação Técnica (Politec), a Polícia Civil e o Instituto Médico Legal (IML).

Esse foi o segundo passeio da escola neste mês. Nesta terça-feira (7), outra turma iria fazer a mesma excursão. Segundo a diretora, o passeio de hoje foi cancelado.

Uma perícia foi feita no local, entre meia-noite e sete da manhã de hoje.

A presidente do Conselho Municipal de Turismo de Chapada Dos Guimarães (COMTUR/MT), Alinne Assunção, lamentou, em nota, a morte do aluno. “O COMTUR de Chapada dos Guimarães, neste momento de dor e consternação, se une aos familiares e amigos do estudante Daniel Hiarle Arruda de Oliveira, para transmitir nossas condolências e solidariedade, pedindo a Deus que conforte os corações de todos”, diz em nota.

Segundo o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), as cachoeiras seguem fechadas nesta terça-feira (7) para que a polícia faça a investigação do caso.

Por Pollyana Araújo, Rafael Medeiros e Rogério Júnior, g1 MT e TV Centro América
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