Contorno Leste na BR-158 em Mato Grosso é ‘saída à brasileira’

Contorno Leste na BR-158 em Mato Grosso é ‘saída à brasileira’

Justiça suspende tráfego no trecho da rodovia em área indígena, e a saída é um trajeto em formato de meia-lua

EDUARDO GOMES
Da Reportagem
Secom-MT

A BR-158, que liga Mato Grosso ao Pará pelo Norte do Araguaia: decisão judicial vira polêmica

Até mesmo defensores da conclusão da pavimentação da BR-158, no Vale do Araguaia (Nordeste de MT), reconhecem a fundamentação da juíza federal em Barra do Garças (509 km a Leste de Cuiabá), Danila Gonçalves de Almeida, em suspender o tráfego no trecho da terra indígena xavante Marãiwatsédé, numa extensão de 110 quilômetros, a partir de 19 de janeiro de 2022.

Não se trata de isolar uma região ou a ligação de Mato Grosso com o Pará por aquela rodovia longitudinal, mas simplesmente de deslocar o fluxo dos veículos para o chamado Contorno Leste, que é uma espécie de meia-lua, que, se por um lado, aumenta o trajeto em 90 quilômetros, por outro, interliga à rede rodoviária nacional as cidades de Bom Jesus do Araguaia, Serra Nova Dourada e Alto Boa Vista (no sentido Sul/Norte), que, com Novo Santo Antônio, formam um bolsão de isolamento urbano.

“É a redenção da nossa economia”, comemora o prefeito Elson Mará (PP), de Serra Nova Dourada, município com 1.678 habitantes.

A rodovia, no trecho bloqueado pela magistrada, é trafegada desde 1968.

Por ela, num trajeto de 803 quilômetros, Mato Grosso se liga ao Pará.

Em seu leito mato-grossense, a BR-158 cruza Pontal do Araguaia, Barra do Garças, Nova Xavantina, Água Boa, Ribeirão Cascalheira, Porto Alegre do Norte, Confresa e Vila Rica.

Sua pavimentação é fragmentada em dois trechos: o primeiro, de Pontal do Araguaia a Alô Brasil, que é uma vila de Bom Jesus do Araguaia, nas imediações de Ribeirão Cascalheira; e outro, separado do primeiro por Marãiwatsédé, do trevo de acesso a Canabrava do Norte e à divisa com o Pará, em Vila Rica.

No trecho do Contorno Leste, a BR-158 será coincidente com a BR-242, uma grande Leste-Oeste, que começa em São Roque, na Bahia, e cruza Mato Grosso a partir de São Félix do Araguaia, até Sorriso via Nova Ubiratã, no Norte do Estado.

O trânsito na área indígena é questionado por liderança da etnia xavante, Ministério Público Federal, Funai, Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e organizações não governamentais.

Da decisão judicial cabe recurso, mas juristas não acreditam que haja reversão.

Quanto a isso, tanto o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) quanto lideranças políticas da região concordam, mas o cumprimento da determinação da juíza Danila esbarra num quê da legalidade burocrática.

O trecho para onde o tráfego seria deslocado é formado por uma malha de rodovias estaduais de pistas estreitas, com parte do trajeto acidentado, e com pontes de madeira que não suportariam o vaivém das carretas que escoam soja da região para o Maranhão.

O Dnit não pode preparar o trajeto para o deslocamento da BR-158, por se tratar de estradas estaduais, e o governador democrata Mauro Mendes, além de não contar com recursos orçamentários para tanto, não deverá autorizar investimento numa malha que será federalizada.

Federalização é a palavra-chave para a execução das obras paliativas, até que se possa conseguir recursos orçamentários ou emendas parlamentares federais para a pavimentação.

Ocorre que o processo para federalizar rodovia é lento e há exemplo disso em Mato Grosso, no Chapadão do Parecis, com a BR-364; e de modo inverso, na BR-080, que foi estadualizada se tornando a MT-322, entre São José do Xingu e Matupá.

A ordem judicial é para o trancamento da rodovia. O prazo restante é de pouco mais de 10 meses.

Mesmo com a concordância quanto à legalidade da decisão judicial, há chororô de produtores rurais, transportadores e sindicalistas rurais, a exemplo do pecuarista Fernando Tulha, que preside o Sindicato Rural de São José do Xingu.

Por outro lado, os 15.320 habitantes dos três municípios que serão contemplados com o Contorno Leste vibram.

O trancamento da rodovia ganhou repercussão nacional e, no dia 7 passado, o presidente Jair Bolsonaro usou suas redes sociais para falar sobre o fato.

Bolsonaro assegurou que o Contorno Leste será construído, mas não citou data para início da obra, por três razões: o trecho é estadualizado; não existe projeto nem licenciamento ambiental para a pavimentação; e, como se tudo isso não bastasse, não há recursos orçamentários para tanto.

O plano para a criação do Contorno Leste foi idealizado em 2006, pelo então secretário de Infraestrutura de Mato Grosso, Luiz Antônio Pagot.

À época, Marãiwatsédé era ocupada por posseiros e, somente em dezembro de 2012, houve a desintrusão da área, que a entregou aos xavantes.

Recentemente, numa reunião remota do ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, com a bancada federal mato-grossenses, políticos e sindicalistas rurais do eixo de influência da rodovia, o senador Carlos Fávaro (PSD) defendeu sua estadualização, mas a proposta foi rechaçada por todos e, de modo mais incisivo pelo senador Wellington Fagundes (PL).

DISTÂNCIA – O deslocamento da BR-158 para o Contorno Leste, além de aumentar a distância das cidades ao Norte do mesmo com Cuiabá, as aproximará ainda mais de Palmas (TO), que é a referência para saúde pública, compras domiciliares e lazer de Vila Rica, Confresa, São José do Xingu, Santa Cruz do Xingu, Canabrava do Norte, Porto Alegre do Norte e Santa Terezinha.

Palmas, a Capital de Tocantins, fica a 470 quilômetros de Vila Rica por rodovia pavimentada, ao passo que aquela cidade dista 1.280 quilômetros de Cuiabá, com 125 quilômetros sem pavimentação no trajeto atual e que aumentará para 215 quilômetros sem asfalto.

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